domingo, 12 de março de 2017

Por que um engenheiro deve escrever?

  


     Por que escrever? Afinal de contas eu sou um engenheiro. Um executor das ciências exatas, um interprete de números, um solucionador de equações, um artista dos teoremas, um escultor de cálculo diferencial integral, um pintor de gráficos e geometria analítica, um dançarino dos sólidos de revolução, um historiador da álgebra linear, um jornalista dos transfinitos...
Imagino que boa parte dos escritores têm uma certa incerteza ou até mesmo uma pequena desconfiança com o "pessoal" das exatas. Pudera, engenheiros, físicos, químicos e matemáticos são conhecidos por sua frieza, seu comportamento metódico, seu raciocínio lógico e por sua "quase" ausência de sentimentos. Claro que isso não é totalmente verdade, e nem mentira. Muitas vezes o profissional de exatas tende a ir direto ao ponto. São bons em escrever manuais, "Acople a roldana A no contra pino B passando pelo moitão C até que a contra-trava D esteja totalmente fixada". Um poeta provavelmente acharia isso maçante até quase a morte, mas deve-se concordar que, caso ele fosse o redator do texto, seria algo no mínimo cômico "A roldana A desfalecia em solidão, parte dela se foi, deixando um imenso vazio... Oh contra pino, que fostes fazer tu com o moitão? Não devíeis passar primeiro por mim? E você contra-trava? Por que andas tão frouxa e sem firmamento? Acaso tu também perdeste seu igual?"
Creio que a objetividade das exatas não agrada o público mais exigente. A literatura do tipo "se B igual não A, então A ou B, tautologia" não dá muito certo com os leitores. Claro que não! Isso é chato. Ninguém quer ler um livro onde o escritor diz: – Olá? – Disse a mulher assustada. Nenhum leitor quer que você diga a ele o que está acontecendo, ele quer sentir, quer experimentar o personagem. Na engenharia, por outro lado, não se tem lugar para duplas interpretações. Tanto isso acontece, que na programação e em lógicas programáveis existe o que chamamos de redundância. Trata-se de deixar o que você deseja sempre funcionando com repetições desnecessárias (mas usuais em caso de falhas) para que o sistema esteja sempre alimentado e funcionando.
Todavia, redundância, tão apreciada nas ciências exatas, é totalmente repulsivo na literatura. Por essas (e diversas outras) questões, engenharia e literatura parecem tão distantes. Parecem, mas não são. Quando entrei na faculdade de engenharia um professor me disse "Aqui vocês aprenderão a desenvolver soluções", ser engenheiro é buscar soluções práticas. Tento aplicar isso no que escrevo, mas peco no meu "cacoete" de engenheiro, o velho "Se A então B". Posso desenvolver tramas bem armadas, soluções lógicas, enriquecer a história com tecnologias que dão realismo ao desenvolvimento, mas me falta, talvez, uma "humanização" do personagem. 
Por isso escrevo. Escrevo para que eu não me transforme em máquina. Escrevo para que eu não seja totalmente moldado, escrevo para me entender, entender os outros, observar mais e ouvir mais. Escrevo porque a cada personagem que se torna tão verossímil para mim a ponto de se tornar real, vejo que meu lado numérico, está mais humano. A engenharia é um curso espetacular, mas de alguma forma ela mata você por dentro. Há pouco lugar para sentimento e muito lugar para raciocínio. Ao sair da faculdade me deparei com um trabalho que também mata aos poucos (Falarei disso em outra oportunidade), e então lembrei que um dia eu também quis ser um artista, lembrei que um dia, para mim, números eram só números e palavras e sentimentos eram tudo o que eu tinha.
Então, escrevo. Escrevo para me tornar humano de novo, escrevo porque acho que a lógica, a exatidão e o desenvolvimento de soluções da engenharia têm muito a oferecer a literatura, contudo, acima de todas essas coisas, escrevo para mim, escrevo para ser feliz.   

6 comentários:

  1. Parabéns pela iniciativa. Muito legal! Gostei da escrita, da maneira que brincou vom a matemática e com as palavras. Serei sua seguidora com o maior prazer. #matemática #palavras escritas

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    1. Olá, Obrigado de verdade. Números e letras têm tudo a ver, basta observar os teoremas, as equações e fórmulas hehehe.

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  2. Parabéns. Amei a forma como trabalhou as palavras. Lembrei do filme Donald no País dá Matemagica, onde podemos perceber a perfeição de Deus.
    Está sensibilidade é a chave dos grandes escritores.



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    1. Comentário muito incentivador, sério. Obrigado de verdade. Adoro esses curtas da Disney também, gostava da série do pateta que imitava um documentário sobre diversos temas do jeito cômico dele hahahaha. Obrigado Antonieta.

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  3. Amei!!! Também sou uma Engenheira que sente falta da literatura e de mais sensibilidade nas soluções. Excelente idéia!

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    1. Verdade, quando saímos da faculdade nos sentimos como pequeninas máquinas de calcular movidos a água e comida, falta esse "tato", essa sensibilidade que você citou, porém a praticidade das soluções e o raciocínio lógico acabam alavancando muito nossa vida. Obrigado pelas palavras e incentivo.

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